quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Margarida

Era uma vez uma menina chamada Margarida. Margarida adorava dançar, porém não sabia. Dançava com qualquer musica, dançava com tudo. Quando estava em meio a muitas pessoas conseguia se conter, mas só ela sabia o quanto era difícil. Dançava com comerciais de TV, dançava com toques de celular, dançava quando menos esperava.

Seu programa preferido eram os clipes de música, passava horas só assistindo para poder (tentar) imitar as danças e coreografias.
Sua irmã, coitada, sofria com isso. Tinha que aturar todas as imitações precárias de clipes, danças esdrúxulas de qualquer ritmo e qualidade. Falava:
- Margarida, pára de dançar!
- Não consigo, é tão legal! – e continuava a dançar.

Até que um dia percebeu que aquela mania estava indo longe demais. Já estava cansada de dançar a toda hora, por qualquer música, mas mesmo assim não conseguia parar. Tentava não dançar, mas acabava sempre com suas danças estranhas: pernas arqueadas, quadris em movimentos circulares, braços dobrados abrindo e fechando e por aí vai.
Não tinha mais controle sobre suas reações dançantes. Antes ela até dançava disfarçadamente, batendo palmas silenciosas, girando devagar como se estivesse procurando algo, ou então dobrando a perna como se estivesse alongando, ela dava seu jeito, mas agora não conseguia mais.

Resolveu procurar ajuda: entrou para os D.C.A– Dançantes Compulsivos Anônimos.
Lá encontrou gente que compartilhava do mesmo problema que ela, e pior até. Um já havia dançado 26 horas seguidas sem parar, até cair desmaiado; outro perdeu o emprego porque toda vez que alguém chegava em sua sala, ele levantava dando um grito, fazia gesto de ‘hola’ e sentava como se nada tivesse acontecido, seu chefe começou a achar que era gozação apesar das inúmeras explicações. O problema dos bailarinos por falta de opção não era reconhecido, as pessoas não levavam a sério, achavam que era tudo graça ou falta de educação, não viam como um problema.

Margarida já estava há 8 meses no D.C.A. e sentia algum efeito. De vez em quando tinha uns deveres de casa, como andar com fone de ouvido escutando sua musica preferida na rua sem dançar. No início deu muitos vexames, mas depois passou a só dançar quando passava por lugares vazios. Até que depois de 3 anos no D.C.A., recebeu alta, estava curada e podia ter uma vida normal em sociedade. Finalmente!

Ela se sentia tão feliz, estava radiante, mal podia esperar por chegar em casa e avisar à sua irmã que não sofreria mais de vergonha alheia por sua causa. Parecia estar sonhando, era uma sensação ótima. Não se sentiu tão bem assim por 3 anos. Foi assim, nesse estado de alegria, até chegar em casa, abriu a porta e encontrou sua irmã sentada no sofá assistindo televisão:
- Olhe para mim, irmã, estou tão bem!
- Deixa de ser ridícula, Margarida. Estou vendo TV, licença. Pára de dançar.
Dançar? Margarida estava dançando? Como poderia?
Foi correndo para o quarto e quando chegou viu-se no espelho. De fato estava dançando. Sem nem perceber. Todo tratamento teria sido em vão.
Mas aquela era uma dança inédita, nunca havia feito aqueles passinhos antes. Eram passinhos incríveis. Então, quando ia começar a ficar triste, alegrou-se novamente.
Foi para a sala e chamou sua irmã para dançar. Sua irmã se enfezou e foi para o quarto ver TV onde tivesse paz. Margarida ficou na sala imitando clipes, muito feliz. Percebeu que não tinha do que se curar. Sua irmã acostumaria-se.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

De novo, Ano Novo

Achei tão bonito,tomei a liberdade de publicar aqui, mesmo com uns dias de atraso:

"Pensem bem: a esperança é uma delicadeza do espírito. Amanhã à meia-noite os relógios não se deterão um átimo sequer, e o Dia Novo, do Ano Novo, estará implacável porém placidamente sobre nós. Nós teremos listas de tarefas e metas e desejos. E pularemos de cadeiras sobre os nossos pés direitos, e saltaremos ondas, e comeremos uvas. Nós, uns tolos.

Uns tolos. Os que acreditam em Amor eterno. Os que acreditam em Amor impossível. Os de coração mole. Os que tentam se proteger do Amor. Os que sonham com um Amor perfeito. Os que esperam. Os que buscam. Os que cansaram de esperar e tentam as maiores bobagens em vão. Os que permanecem onde estão porque acham que não merecem mais. Por causa de outros amores. Porque acham que é melhor. Os que acham que encontraram o par perfeito, a metade da laranja. Os que encontraram, mas não podem ficar com ele. Os que aceitam a solidão. Os que não aceitam. Os que escrevem versos. Os que lêem e choram. Os que lêem e agem. Os que lêem e desprezam. Os que não lêem. Os que mandam flores. Chocolates. Os que só mandam chocolates e mais nada. Os que reclamam do Amor. Os que reclamam de tudo. Os que se complicam. Os que pensam ter simplificado. Os que seguem navegando. Os que se perdem. E os que naufragam felizes.

Uns tolos delicados e cheios de esperança, todos nós. Que tenhamos então o mais feliz dos Felizes Anos Novos, em todos e em cada Dia Novo."


Jason Carneiro

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Sonho

Hoje sonhei com você. No sonho você vinha despida de alegorias. Simples e casual. Não havia orgulho, arrogância ou ironias, só havia eu e você – essencialmente.
Na cena, muita gente e barulho, eu sentada num canto, em sua chegada fez-se um silêncio repentino. Me lembro de abaixar a cabeça e sorrir.
Você surgiu como o ápice do meu sonho.
Não houve diálogo, mas a sensação era de reconciliação, um olhar nos bastou para que ficássemos bem, nos permitimos ter um ao outro de novo depois de perceber que não adiantaria relutar. Um olhar e o alívio.
Você surgiu como o ápice e o fim do meu sonho: acordei.