domingo, 2 de fevereiro de 2014

Solilóquio

Avolumei meus livros de poemas comigo.
Neles, tudo o que parece impossível descrever.
Em mim, essa tristeza tamanha e sonora de você.
Eu quase sinto dor, mas eu finjo.
Eu quase grito, mas eu finjo.
Eu quase me desespero, mas eu finjo.

Se eu pudesse, prenderia os seus passos aos meus.
Mas não posso, nem devo.

Amigos? Onde estarão todos eles?
Finjo para mim não tê-los.
Finjo para mim tê-los.
Afinal, sinto-me só,
porque ignorei sua presença,
porque ignorei que precisava fazê-los.

Amontoei meus poucos livros de poemas
comigo.
Finjo para mim,
Que sou poeta como eles.
Mas não me leem – de que me serve?

Escrevi esse poema de forma diversa,
como se estivesse ditando-o em voz alta
a mim.
Ele veio pronto, ele se fez enquanto se fazia.
Eis aí, eis aqui.

Em que eu vou me agarrar

Em que eu vou me agarrar,
Meu Deus?
Em que eu vou me agarrar,
Amor?
Se tu, razão de quase toda a felicidade que conheço,
Parece-me, as vezes, tão tão fugaz?

Não olho pela janela
por já quase não ter esperança,
Mas fico atenta com o vento vindo lá de fora,
Que me deixa sonolenta e impede de chorar.

Acaso me perguntassem hoje,
Eu diria que não tenho nada, que não quero nada, que não gosto de nada.
Acaso me estendessem hoje as mãos, eu respiraria fundo,
E diria, sem falar, que estou à espera.

Meu cachorro, fiel companheiro de silêncios inomeáveis,
Me deixou para sempre.
Nessas horas, e em muitas outras, eu sinto o abismo que é a falta dele.
E choro quando não posso evitar.

Se pudesse escolher alguém, fora tu e ele,
Para quase me compreender, seria alguém familiar,
não alguém que nunca vi.
Mas exijo de mim calar-me,
e não criar compromissos revelando-me além do usual.

Se alguém viesse hoje me perguntar,
Eu diria que quero a certeza de ti,
E de uma vida além do bem, do mal,
do sucesso e do fracasso.


sábado, 1 de fevereiro de 2014

Arritmia

Vejam só ela,
se agarra a sentimentos primários
E a pensamentos sem palavras.
Deixa escapar umas lágrimas
e fica empacada
À espera de que adivinhem sua demanda
a tomem pelas mãos
e a levem no colo,
em segurança.
Vejam só ela,
pequena ainda,
uma menina.
Mas já pega ônibus
sozinha.


réplica

"não tires poesia das coisas."
elas é que tiram poesia de mim,
eu disse, impaciente, a Drummond

Bruta noite

A bruta noite
Cai sobre meus ombros
e o peso é de tudo o que
não soube, não sei.

A bruta noite me atormenta
Eu quase ouço os risos
Eu quase adivinho os assuntos
E sei que onde há fogo
há fumaça.

A bruta noite
insólita
solitária
Queima em pensamentos
hostis.

A bruta noite pede logo
a luz seguinte
Mas ela não se apresenta
ela se nega e descansa
Do outro lado, onde há paz.

A bruta noite me assiste
E se compadece.
Não há saídas, só ameaça e dúvida
Num caminho de espera
E ausência.