sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O metrô

O metrô demorava a chegar. A espera tinha um barulho de ventilador e um vento ralo. Enfim, chega. Uns andam devagar enquanto esperam-no parar, as portas abrem-se: todos entram, poucos saem. Estava cheio, mas não lotado - alguns ficaram de pé.
O metrô logo começa a andar. A garota de mochila olha em volta, quase despretensiosamente e, quando voltaria o olhar para si, dá de olhos nos olhos de um garoto que a olhava pelo reflexo da janela. Surpreende-se e fixa, rápida, o olhar em um outro ponto qualquer. Passaram-se segundos e quis olhá-lo novamente.
Ele fitava o chão. Bonito, ela pensou. Sozinho, sentado numa cadeira do canto, quieto, parecia ter pensamentos a distraí-lo, mas voltou-se de novo para a garota. Desta vez, era ela quem olhava o chão. Também parecia repleta de pensamentos e ele quis conhecê-los. A garota, acreditando o garoto estar olhando para o chão ou talvez para as paredes, tanto fazia, pousou olhos certeiros nele.
E de novo cruzaram-se os olhares. Encanto. Encantaram-se, então.
Ela virou o rosto para o outro lado, tamanho o susto. Ele, mesmo abalado, confirmou olhos intensos nela.
A garota desistiu de fitá-lo. Estava fazendo o que? Flertando? Deu-se um nervoso em seu estômago e veio-lhe vontade de rir. Prendeu os lábios para não parecer louca. O garoto, vendo que ela olhava para o lado oposto, virou seu rosto para a janela, mesmo tendo só paredes lá fora.
Ninguém havia percebido, mas algo acontecia naquele vagão. O penúltimo vagão. O primeiro amor.
A garota juntou sua coragem e decidiu olhá-lo mais uma vez. Ele tinha um jeito manso que a fazia querer tê-lo por perto. Nesse instante não a olhava, mas mexia nos cabelos como se soubesse estar sendo observado. Parou de mexer nos cabelos e olhou para frente. Estava sério e não carrancudo, tinha simpatia nos traços e era virilmente doce. E quanto mais ela reparava, mais encantos apareciam. Sentiu-se boba por estar tão boba. Parou de olhá-lo.
Os pensamentos dele eram um, eram ela. Sentiu medo de nunca mais vê-la. Quis levantar, perguntar seu nome, sorrir e segurar sua mão. Sentiu-se bobo por estar tão bobo. Mas só conseguia pensar nela.
Olharam-se instintivamente. Admiração. Admiravam-se, enfim.
Compreenderam-se com perfeição. Souberam um do outro como não sabiam de mais ninguém. Os dois estavam imóveis ainda descobrindo-se, mas não tinham outro nome para aquilo senão amor. Amavam-se sem entender como. Sem imaginar outro amor. Sem pensar no instante seguinte. Como não achavam possível.
Sustentaram os olhares. Ele sorriu sem medo. Ela sinalizou com um meio sorriso que estava feliz.
Continuaram. Ele prendeu o riso e olhou para o alto depois de novo para ela. Ela riu contente sem conseguir conter-se ou tirar os olhos dele.
Fitaram-se até estarem íntimos. Ele sorriu e, virando as palmas das duas mãos para cima e encolhendo os ombros como quem não consegue entender, quis saber se ela entendia. Ela fez que não dando de ombros para entender qualquer coisa. Nesse instante ele já viajava pelas ondas dos cabelos dela – como brilhavam. E ela olhava-o como se o esperasse terminar de estudá-la.
Ele adorava cada parte daquele ser: boca macia, dentes meio voltados para trás, olhos grandes e pidões como os de seu cachorro, nariz singelamente torto e pequeno, cabelos volumosos, rosto fino e bem contornado. Adorava até mesmo aquelas pernas suaves e curvilíneas, sensualmente morenas. E quando ela deixou escapar uma risada da demora dele em olhá-la, a voz macia e doce, até meio infantil, saindo daquela boca que mostrava os dentes brancos, parecia feitiço bom.
Ele tinha cabelos claros, curtos e macios jogados meio para frente meio para o lado, seus olhos eram verdes e os mais sinceros que ela já vira. Quando sorria, seu sorriso mobilizava todo o rosto e não havia parte que não sorrisse. Ela via-se eternamente olhando para ele. Sentiu vontade de caminhar numa praia vazia, num fim de tarde, talvez dividir um sorvete, tê-lo deitado em seu colo e afagar-lhe os cabelos enquanto riam sossegados. Voltou a si quando percebeu que ele ria da sua atenta distração.
E quiseram tocar-se, sentir o cheiro um do outro, respirar o mesmo ar. Mas o trem parou e garota desceu na estação anunciada.

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