quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Pobres crianças

Pobres crianças. Basta tomar um pouco de consciência sobre o mundo que logo começam os tormentos. Entulham-nas de medos desnecessários só, talvez, para melhor controlá-las. Medo do escuro, medo de morcego que chupa sangue, medo do bicho papão debaixo da cama, fantasmas, bruxa... E elas, as crianças, ficam com esse tipo de pensamento em seu imaginário fértil. Passam a ter medo de dormir sozinhas, ir ao banheiro de noite, olhar em baixo da cama. Começam a imaginar personagens assustadores enquanto poderiam sonhar tranquilamente.

Pobres crianças. Os próprios pais criam seus medos para, depois, impacientemente desmenti-los. “Que bobagem! Fantasmas não existem. Não têm morcegos no seu quarto nem fantasmas no escuro. Me deixe dormir, não há nada embaixo da sua cama, filho!”

Pobres crianças. Fazem-nas acreditar que a vida precisa ser dura. Que precisam, a qualquer custo, amadurecer. Disfarçadamente, cortam as asas de seus sonhos.

Como sofrem. Aprendem com quem já desaprendeu a se deslumbrar com pequenas coisas. Crescem acreditando que se deve buscar enriquecimento. Que os talentos ficam esquecidos na adolescência. Que os desejos podem ser renunciados. Que é errado pensar e dizer, querer e fazer. Que crianças só dizem bobagens.

Como sofrem os pequenos, cheios de sonhos e instinto de liberdade. Só querem brincar com terra e bola, mas não podem se sujar nem suar. Só querem a companhia dos pais que estão ocupados demais para brincar. Ora crianças, adultos não perdem seu tempo com brincadeiras, estão trabalhando muito. “Vão assistir televisão!”. Aí, são colocadas em frente ao educador eletrônico. Que programação variada! Será suficiente para mantê-las paradas por um bom tempo. E depois do desenho: telejornal, novela, propagandas. Pronto, acesso a bastante coisa que não deveriam: violência, erotismo, estímulo ao consumo. “Não se pode protegê-las da realidade!”. Mais porcarias entulhadas na cabeça das crianças.

E como sofrem as crianças! Se fazem o que não devem, apanham. Se choram, apanham. Conhecem cedo o poder de controle da violência. Se erram de novo, aos berros lhe mostram o certo a fazer. E ainda querem que aprendam rápido. Não pode gritar, não pode sujar, não pode fazer bagunça. Só dizem o que não se deve fazer. Adultos podem tudo, criança, quase nada. Adultos são espertos, crianças nem gente são ainda. Talvez quando elas, as crianças, virarem gente, possam bater, possam gritar... Não virem gente!

Crianças... Descobrem cedo o sabor de um refrigerante lotado de glicose e corante, de uma batata frita pingando gordura saturada. Aprendem que é mais saboroso do que um pedaço de melancia ou uma fatia de beterraba. Ficam logo com o paladar viciado. Mais tarde chegam os problemas: diabetes, pressão alta... E ficam como os pais, que tem diabetes, pressão alta...

Talvez, se eles lembrassem de como é ser criança jamais repetiriam tais barbaridades. Lembrar de como é pensar e falar, querer e fazer, se emocionar e chorar. Entristecer e chorar também e logo em seguida, olhar para o lado e ver algo que lhes enche de alegria. E abrir um sorriso em meio ao choro. E esquecer a tristeza. E dar gargalhadas. E só aproveitar aquele momento. E esquecer que as coisas são tão difíceis. E querer estar perto de quem gosta. E sonhar. E ser criança de novo.

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